Você está indo a uma festa de aniversário, nenhum traje foi determinado. O evento será realizado no horário da tarde, você resolve ir de short ou bermuda, um look mais descontraído. Ao chegar no local, as demais pessoas estão usando roupas sociais, vestidos longos, gravatas e blazers. Instantaneamente, você fica incomodado, não se sente adequado para frequentar o espaço. Já parou para pensar por que estar trajado diferente, nesse contexto, provoca um desconforto pessoal, social e até mesmo emocional? Isso pode ser traduzido como um simples caso de violência simbólica. Esse tipo de agressão se torna muito mais danosa quando situado em questões de raça, gênero, etnia e classe social. Quer saber mais sobre o conceito? Vem que a gente te explica.
O que é violência simbólica?
Para Pierre Bourdieu, sociólogo francês, os seres humanos possuem quatro tipos de capitais, são eles: 1) o capital econômico, a renda financeira; 2) o capital social, suas redes de amizade e convívio; 3) o cultural, aquele que é constituído pela educação, diplomas e envolvimento com a arte; 4) capital simbólico, que está ligado à honra, o prestígio e o reconhecimento. É através desse último capital que determinadas diferenças de poder são definidas socialmente. Por meio do capital simbólico, é que instituições e indivíduos podem tentar persuadir outros com suas ideias.
A violência simbólica se dá justamente pela falta de equivalência desse capital entre as pessoas ou instituições. O conceito foi definido por Bourdieu como uma violência que é cometida com a cumplicidade entre quem sofre e quem a pratica, sem que, frequentemente, os envolvidos tenham consciência do que estão sofrendo ou exercendo.
Onde está o agravante?
A ilustração do traje de festa no início da matéria é muito pequena se comparada aos níveis que a violência simbólica pode atingir. Mais que um caso individual relacionado a uma roupa, o alcance dos meios de comunicação, por exemplo, pode ser usado como instrumento para execução da violência simbólica em grande escala. Isso é feito através da propagação de ideias que pertencem às camadas dominantes (que, usualmente na sociedade capitalista, são as de maior capital econômico) para as camadas minoritárias, a fim de que a ordem social se mantenha.
Quando as questões raciais encontram a violência simbólica
Donald R. Kinder e David O. Sears, pesquisadores das universidade de Yale e da California, respectivamente, ainda na década de 1970, indicaram a existência do racismo simbólico. Para eles, o conceito se baseava no fato de que uma das vertentes do preconceito racial era apoiada na crença de que os negros violavam os valores da ética protestante do povo norte-americano. Não era necessariamente uma motivação baseada na ocupação de vagas no mercado de trabalho, algo que afetaria seu capital econômico, mas sim, que afetaria o capital simbólico da nação. No entanto, é importante ressaltar que essa ainda atual forma de racismo é tão ou mais danosa que manifestações mais abertas. Representando um perigo constante, uma vez que pode ser convertida em agressões físicas.
No Brasil, uma forma de violência simbólica está no uso dos estereótipos relacionados aos negros. Segundo o sociólogo jamaicano Stuart Hall, a estereotipagem é parte da manutenção da ordem social e simbólica. Alguns estereótipos nacionais associam a figura do negro à preguiça e a figura da mulher negra a expressão racista “mulata”, mulher feita para apenas suprir prazeres sexuais. Uma pesquisa dos psicólogos sociais Marcus Eugênio Oliveira Lima e Jorge Vala revela que, ao contrário do esperado, após o surgimento das leis anti-racistas, o racismo não cessou, mas tomou outras formas menos abertas e flagrantes. É importante lembrar que o combate ao racismo pode começar na linguagem.
A dominação masculina sobre a mulher como violência simbólica
Em seu livro A dominação masculina, Pierre Bourdieu, traz uma reflexão a respeito da violência simbólica no que toca a mulher na sociedade patriarcal. Segundo ele, é sempre esperado que o homem tenha o capital maior do que o da mulher, independente do tipo. Isso se dá pela naturalização da dominação masculina na sociedade. Ao julgar a mulher incapaz de ocupar determinados cargos, oferecer salários mais baixos para mulheres em mesmos cargos que homens e considerar que elas devem ganhar menos porque engravidam, há aí um dolo simbólico que reflete nos outros campos, como o econômico.
A ideia de dominação masculina sobre o corpo da mulher é refletida nos casos de feminicídio, assassinato de mulheres pela razão de ser mulher. O crime era anteriormente tido como algo passional (assassinato por amor), só que, na verdade, é mais uma forma de mostrar a existência de uma noção de superioridade do homem. Os casos de feminicídio acontecem geralmente após o término de um relacionamento. Por acreditarem que têm a propriedade sobre o corpo da mulher e por considerarem que não têm nada a perder, são cometidos os assassinatos.
Ainda tem alguma dúvida sobre o assunto? Compartilhe conosco nos comentários!
Comentários