Por Adige Silva
Devido à pandemia do novo coronavírus, o Dia das Mães de 2020, para muitas famílias, não vai ser de celebração e nem de confraternização. O distanciamento social é necessário, mas também é cruel para filhos e mães que vão ter que ficar separados. Mais duro ainda, parece ser, para as mães dos profissionais de saúde que atuam na linha de frente do combate à Covid-19.
"É muito difícil, para uma mãe, saber que sua filha está saindo para trabalhar, para ajudar a salvar vidas e, ao mesmo tempo, está colocando a própria vida em risco. Sinto muito medo", desabafa Ana Maria Santos*, aposentada de 67 anos. Ela é mãe de Cláudia Rodrigues*, 48 anos, enfermeira que atua em um dos hospitais de campanha na Região Metropolitana do Recife (RMR).
O receio de 'Dona Ana' tem um motivo. Por sua atuação, Cláudia foi contaminada pelo vírus, mas não teve sintomas. O mesmo ela não pôde dizer de alguns colegas de profissão. "Perdi alguns colegas (de profissão) e não está sendo fácil. O emocional da maioria dos profissionais de saúde está muito abalado. Os ambientes são bem insalubres para atendimento, porque não fomos estruturados para essa pandemia", lamenta a enfermeira.
Aperto em dobro no peito
A angústia que Dona Ana sente, Janete Machado, de 75 anos, sente em dobro. Ela tem duas filhas atuando no combate ao coronavírus. "Fico preocupada, mas feliz por elas estarem salvando vidas. Fico rezando e pedindo a Deus que as protejam", afirma a aposentada.
Aureli Machado, médica e uma das filhas de Janete, conta como a pandemia mudou sua convivência com a mãe: "Ela está isolada na casa dela, com a minha tia Lucinha. Ligo constantemente; só consigo vê-las quando vou levar a feira, de longe. Minha mãe fica chorando no portão com o rosto coberto por uma máscara. Meu coração sofre, mas sei que é para o bem da gente", relata a profissional.
Por causa disso, a tradicional celebração presencial do Dia das Mães da família Machado não vai ocorrer. No entanto, Janete prefere manter viva a esperança por dias melhores. "Iremos passar separadas, cada qual nas suas casas. Quando tudo isso passar, voltaremos a nossa convivência, se Deus quiser e Ele quer", projeta.
A dor das filhas que também são mães
Além dos cuidados com suas mães, Cláudia e Aureli têm outra grande preocupação: não transmitir a doença para os filhos. A dura experiência nos hospitais justifica esse receio, segundo Cláudia.
"É muito difícil você ver pessoas morrerem na sua frente. É uma sensação de impotência muito grande. Você chega em casa, olha para sua família, e o que menos você quer é que eles não se contaminem, porque a dor é muito grande", comenta.
Para evitar a contaminação do filho e da filha, que residem com ela, uma força-tarefa foi montada. "Na minha residência, eu criei um fluxo. Entro pela área de serviço, o sapato fica do lado de fora. Na entrada, já fica um balde com água e sabão, que eu já coloco a roupa que eu vim da rua de molho. Também na área de serviço, tem um banheiro que utilizo para tomar banho", explica.
Procedimento semelhante foi adotado por Aureli, que também tem dois filhos, além do marido que também é médico. "Primeiramente, (o que fazemos é) higienizar absolutamente tudo que vem da rua. Tomar banho é um alívio", ressalta.
A médica também comenta a lição que tudo isso está deixando e vai deixar para o futuro. "O que vai ficar de tudo isto? O que realmente importa? Separei apenas duas roupas para trabalhar e um sapato emborrachado, nenhuma maquiagem, não sei mais o que é fazer unha ou arrumar o cabelo, mas descobri que isto não me incomoda. O que incomoda é a saudade que eu estou sentindo da minha família, dos meus amigos. Devemos dar mais importância às pessoas, à vida, ao amor. Mãe, eu amo você".
*Os nomes com o sinal de 'asterisco' são fictícios para preservar a identidade das fontes, que optaram por não se identificar
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