Hoje, dia 20 de novembro, é marcado como o Dia da Consciência Negra homenagem póstuma a Zumbi dos Palmares em ocasião de sua morte, quando era líder do Quilombo dos Palmares. A data além de rememorar os feitos de Zumbi na luta pela emancipação do povo negro escravizado, representa atualmente para o movimento negro, um símbolo de luta e resistência contra as opressões racistas.
No entanto quando fala-se de consciência negra, muitas pessoas questionam: “se somos todos humanos, todos iguais, para quê um dia de consciência negra?” e é exatamente aí que precisamos falar sobre ser negro no Brasil e o porquê da necessidade de despertar uma consciência sobre isso.
Como todo mundo sabe - ou ao menos deveria saber - o Brasil foi invadido lá pelos anos de 1500 por europeus oriundos de Portugal que escravizaram povos indígenas e anos depois trouxeram compulsoriamente africanas e africanos para trabalhar nas lavouras de cana-de-açúcar também na condição de escravos. É assim que se inicia a história dos negros no Brasil, através de um processo de trabalho escravo que se estendeu por mais de 300 anos. Depois de muita luta, resistência, rebeliões dos negros e negras escravizados e pressões governamentais estrangeiras, a escravidão no Brasil findou-se em 1888 com a Lei Áurea. Infelizmente o fim da escravidão no Brasil não trouxe o fim do preconceito racial.
Mas afinal, o que é preconceito racial?
Conversamos com professores, ativistas e psicólogos para tentar entender o que é o preconceito racial ou racismo, e como ele funciona no Brasil. Segundo a ativista da Rede de Mulheres Negras de Pernambuco, Piedade Marques, “o racismo é produto e produção eurocêntrica que garante privilégios aos europeus, centraliza riqueza, estabelece sociedades desiguais e desumaniza pessoas”. Isso significa dizer que o racismo, não é uma construção das pessoas negras, ele foi criado para justificar um sistema econômico e de produção (lembram das plantações de cana-de-açúcar?) que privilegia europeus (os portugueses), cria sociedades desiguais (no Brasil de 1800 negros e brancos exerciam papéis sociais bem distintos) e desumaniza pessoas (negros e indígenas não eram vistos como pessoas e por esta razão justificava-se escravizá-los).
Mas se a escravidão já acabou há mais de 100 anos, por que ainda falamos nela quando discute-se consciência negra e não consciência humana?
Porque historicamente como falamos acima, negros e brancos experienciaram vivências bem diferentes: enquanto os primeiros eram tratados como mercadoria, os últimos se beneficiavam do fruto do trabalho compulsório dos primeiros. A população negra ainda lidera os piores índices de IDH no Brasil, ganham menos, são mais suscetíveis a sofrer violência do Estado, morrem mais de causas violentas, tem menos acesso à saúde. Segundo o Mapa da Violência divulgado em 2015, jovens homens negros tem até 4 vezes mais chances de sofrer homício que jovens brancos na mesma faixa etária. Isso quer dizer que, apesar de todos sermos humanos, existe um recorte racial no que tange às questões sociais que resulta em desigualdades abissais entre negros e brancos no Brasil.
O fim do racismo é possível?
De acordo com Jesus Moura, psicóloga e mestra em Psicologia, o racismo enquanto uma ideologia dificilmente terá fim. “o racismo é um processo ideológico que vem das relações de poder. Ele acontece tal qual as pessoas comecem a se relacionar e um dos elementos que fortaleceu o racismo foi a eugenia que trouxe a ideia de que um grupo é mais capaz e humano que outros”, afirma. E essa noção perdura até os dias atuais quando se discutem políticas públicas de reparação histórica como cotas em universidades e concursos públicos por exemplo.
Por isso falar em Consciência Negra, é demarcar um espaço político, social e afetivo na luta contra o racismo e na busca da equidade racial, afinal, ainda que existam pessoas de diversas tonalidades de pele no Brasil, 54% de sua população é autodeclarada negra e sua experiência no mundo é demarcada pela carga histórica que isso traz, não podendo portanto resumir-se apenas numa tomada de consciência humana.
Não somos todos iguais e não há problema nenhum nisso, mas é preciso reconhecer que enquanto a sociedade perpetuar ideais racistas e privilegiar a branquitude em detrimento de pessoas não-brancas, o racismo continuará a ser um problema social que se arrastará por séculos e séculos.
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